quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Esperando o trem


Passando por um idoso, me dei conta de que naquele corpo, cansado e sem muito brilho, haveria uma história de vida, quem sabe a ser explorada. Era como um papel velho, estava sentado na calçada, sujo, amarrotado e desanimado. Ao seu lado, a feria do dia, algumas moedas. Um pedinte? Talvez.

Um papel velho e usado, sem utilidade, pegamos e colocamos no lixo, Mas aquele ser de 92 dois anos, claro que perguntei a idade, estava esperando o trem da vida. Ele mesmo disse, como se estivesse realmente em uma estação. Contou-me que quando jovem, andava todas aquelas ruas, vendendo de porta em porta, se dizendo mascate.

Eu olhava para aquele homem, que mal me via, e percebi nele cada uma das pessoas que passavam por ali. Um dia, com sorte, estariam esperando pelo trem da vida, possivelmente em outras estações. Obriguei-me a perguntar se não tinha família e, novamente a história de muitas outras, ele contou que perdera a esposa, quando seus dois filhos nasceram, foram gêmeos. Então, perguntei-lhe dos filhos e a resposta, sussurrada, foi de que estavam no exterior. "Exterior onde, meu velho?". Olhou-me novamente, tentando me encontrar, deu um sorriso de dois dentes e disse, o menino na terra dos cangurus, com certeza na Austrália   e a menina nos "steites".

Questionei se queria levantar, mas disse que não conseguia mais andar. "Mas como chegou até aqui?", cadeira de rodas, foi a resposta. "E, onde está?", não sei. Queria saber se era verdade ou não, insisti e ele relutando, respondeu, "fui roubado". Fiquei indignado! Afinal, quem não ficaria? Minha indignação parou no sorriso do velhote. "Estou indignado, porque roubar de alguém como o senhor?", perguntei. "Porque o quê?", disse ele. Pensei que ele não houvesse entendido a pergunta e demonstrando grande percepção, emendou "Porque está indignado?", fiquei em silêncio.

Antes que eu respondesse, começou a me explicar que de nada lhe serviria a cadeira de rodas, se nem força para subir nela tinha mais e, se subisse, não conseguiria movimentar as rodas. Pareceu-me conformado, mas eu não! "Não é justo, a cadeira era do senhor, onde está a justiça, quando precisamos dela?", neste momento foi ele quem ficou em silêncio.

Com a falta de resposta, resolvi agir e vasculhei no meu celular, até encontrar o telefone da prefeitura e pedir apoio social àquela pessoa. Enquanto aguardava, juntei as moedas que haviam pelo chão e coloquei no bolso de seu velho paletó. Virou o corpo com muita dificuldade e retirou-as, com as mãos trêmulas, disse que não eram dele e que não estava pedindo nada, pois para onde ia, não precisava de dinheiro. Assustei-me! Oras, com certeza ele precisava muito mais do que eu.

Ele segurou o meu punho e me pediu calma, novamente, não ouvi mais nada, além do som de uma cascata. Tudo ficou escuro e mudou de contorno, as pessoas sumiram. Quando vi novamente a luz, estava em  uma estação de trem, queria falar, mas as palavras não saiam, mal conseguia erguer o corpo. Um som ao longe me chamou a atenção, que agora estava dividida entre o velho e todo o cenário.


Assim que ele ficou de pé, apoiado no meu braço, sua face mudou e ficou mais jovem, provavelmente com uns sessenta anos. Eu estava assustado, ele sorria. surgiu uma cascata e por detrás da cascata o som. Tornou-se ensurdecedor e logo um grande saiu pela cortina de água. Pensei em fazer força, mas seu punho forte pressionou meu braço, resolvi esperar, o trem parou. Sem trilhos, sem chão, era só a estação, a cascata e o trem. Ele me disse obrigado e apertou minha mão, já subindo no trem. Quando a largou, tudo voltou ao normal e um sujeito me perguntou se estava tudo bem. Respondi que sim, sem ter muita certeza. Anunciou-se como assistente social e perguntou se havia visto alguém, acompanhado de um velho doente. Que é que eu poderia fazer, disse que não e segui meu caminho! Apenas as moedas eram prova cabal do que eu vivi ali. Será?

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Obrigado, até a próxima postagem! Anota ai na sua agenda.

J.C.Hesse - Autor das obras (Tallek) (Cartas & Sombras) (Abissal) e (Diário do Zézu - Passagens),
Responsável pelo blog: J.C.Hesse
Assessor Administrativo do Clube dos Novos Autores - CNA
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